cgambozinosCaminhada ao Gambozinos

  • Era sábado. Um sopro de chuva chicoteava ao longo de varias horas o tão empapado solo, e, as poças de água tinham um reflexo brilhante bege. O dia corria lento e já era meio da tarde, mas, o dia parecia escuro como se fosse o anoitecer. A luz da tarde escoava-se e o crepúsculo surgia ainda muito húmido. Com o aproximar da hora, não havia qualquer réstia de esperança de uma mudança repentina. As minhas preces inaudíveis, eram pragas resmungadas contra o tempo, que eu prenunciava no fundo da minha alma. Talvez, Deus me tenha escutado, por estar já cansado das minhas preces, fez-me a minha vontade. Parou de chover. A chuva podia ter parado, mas o piso ainda era um atoleiro de lagos rasos e armadilhas escorregadias.
  •  A hora chegou, e sentia-se a noite fria e molhada, mas não tão fria nem tão molhada como a pouco tempo atrás. A presença humana aquecia os trémulos corações frios da saudade. E as cerca de setenta almas, além de dar à noite fria cor transmitiam o calor humano ao local, que era o nosso ponto de partida. No início do trilho da floresta, percurso implantado e promovido pela autarquia de Ovar.
  • A floresta estendia-se até o horizonte, um vasto emaranhado de raízes e ramos pintados em negro que a noite mesclou os diversos tons de verde, retirando-lhe a cor. Um caminho abria-se por entre os pinheiros e as árvores que compunham toda esta floresta. As gotas ainda suspensas cintilavam nos galhos e folhas como pequenos diamantes quando a luz pálida ou rosada das lanternas incidia sobre elas. Um espetáculo que incendiava o bosque e o transformava num lugar sagrado. Por um momento a floresta pareceu um mar de um verde profundo, tempestuoso e palpitante, eterno e impossível de conhecer. Mas aos poucos os olhos se acostumam à escuridão e tudo parece mais real.
  • O caminho passa a ser iluminando por um fogo das estrelas, cintilantes que se mexem nas mãos de quem as transporta e a floresta se transforma num cristal. À medida que nos afastávamos do início a escuridão aprofundava-se e deslizava pelos espaços vazios entre as árvores, e uma sensação de medo cresce.
  • Medo do escuro? Ou medo de um gambozino mais traquina? Este seria o tema do nosso encontro: caça aos gambozinos. Não acredito em gambozinos, mas que os há, há. Há os louros, morenos, corpo escultural e até os franzinos. Só quem tem um coração puro é que pode obter a graça de os ver.
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  • Aquela noite estava muito viva, cheias vozes que brincavam. Os sons deixavam inquietos os tímidos gambozinos. A floresta parecia assombrada, seria um nome mais apropriado. Ansiosos por ver os mistérios e maravilhas que se escondem para lá de cada novo horizonte. Eis uma das maravilhas que o ANDAR trouxe até nós. Os intrusos tinham penetrado no bosque e toda a pachorrenta vida tinha ficado petrificada pelo inesperado movimento noturno que faziam guerra com os filhos da floresta.
  • Em certos lugares, os ramos teciam uma abóbada por cima da cabeça, e as botas na vegetação rasteira faziam restolhar as folhas mortas.
  • As gotas pingavam por todo lado, um tipo mais lento de chuva com suave música, que os sons de homens, engolidos pela húmida natureza verde, e em pouco tempo o que ouvia era o contínuo bater das botas esmagando a areia húmida.
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  • Imaginai velhas acácias retorcidas e pinheiros altos, cobertos de musgo, como barbas de duendes, que se escondem na casca dos pinheiros e que as deixam como se fossem líquenes. No fim das contas, há magia no bosque.
  • A noite escura deixa o bosque sussurrante deixa-nos sem fôlego quando um som mais agudo se ouve. Enquanto o bosque sossega no seu silêncio, o murmúrio de vozes humanas, com uma gargalhada aqui, uma praga ali, o vai acordando. Estava escuro entre as árvores, aonde a Lua não chegava.
  • Mas não podia negar que o bosque também possuía um certo poder. Podiam sentir-se as criaturas a observar com um milhar de olhos invisíveis. O bosque estava tão silencioso e calmo... Mas, os gambozinos estavam ativos e brincalhões.
  • Há duas espécies catalogadas de gambozinos: os de origem galaica celta e os de origem gaulesa. É certo que o nos interessa são os de origem galaica celta. Com certeza, há muitas coisas que ainda não compreendemos. Os anos passam às centenas e aos milhares, e o que vê qualquer homem vivo além do ver passar das estações? Olhamos as montanhas e dizemos que são eternas, e é o que parecem ser... Mas, no correr do tempo, montanhas erguem-se e desfazem-se, rios mudam de curso, estrelas caem do céu, e grandes cidades desaparecem ou afundam-se no mar. Pensamos que até os deuses morrem. Tudo muda. Talvez a magia um dia tenha sido uma força poderosa no mundo, mas já não o é. Retomando um pouco a conversa atrás. Há homens que se chamam de magos e feiticeiros, mas, nenhum consegue chegar aos pés de um gambozino descendentes dos antigos galaicos celtas.
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  • São criaturas mitológicas que aparecem ligadas ao folclore europeu. Apesar de sua origem não ser completamente conhecida, o mais provável é que tenham surgido junto com elfos, anões e outros seres do além na mitologia celta e escandinava, em países como Inglaterra, Noruega e Suécia.
  • Aliás, dependendo da região de origem, essas criaturas assumem formas e nomes diferentes. Na maioria dos relatos, são retratados como pequenos espíritos esverdeados e travessos, que vivem em um universo paralelo mas interferem nos destinos humanos. Quando são bem tratados, eles ajudam nas tarefas domésticas, mas se ficam zangados podem aprontar das suas, azedando uma jarra de leite ou inventando pesadelos para atrapalhar nossos sonos. Por isso, era costume em algumas regiões da Europa deixar um prato de Papa de farinha de trigo para agradar essas criaturas ou bater três vezes na madeira para desejar-lhes boa noite. Na Antiguidade, serviam para satisfazer a eterna necessidade humana de encontrar respostas para vários fenómenos inexplicáveis.
  • Com o avanço do cristianismo na Europa, acabaram demonizados, identificados como anjos caídos ou pequenos diabinhos. Mesmo assim, as crenças milenares não desapareceram por completo. Prova disso é que até hoje, em regiões mais isoladas da Alemanha, acredita-se que existam.
  • Seres mais que fantásticos. Histórias existem desde que os povos celtas ocuparam as ilhas britânicas, no século III. Os escritos mais antigos, entretanto, são os da mitologia islandesa do século XIII que divide em três tipos: os brancos, bons, e os negros e cinzentos, perversos. Dependendo da história, assumem formas que vão de espíritos alados a anões. Todos têm poderes mágicos e são quase imortais - só morrem se forem assassinados. Na Antiguidade, costumavam ser adorados em rituais nas florestas da Escandinávia. Vivem isolados em minas ou em buracos nos troncos de árvores. Artesãos habilidosos produzem joias incríveis e guardam tesouros enterrados.
  • Há muito, muito tempo a Terra pertencia às criaturas da floresta. Eles vigiavam-na e cuidavam dela, brincavam, dançavam e cantavam, tratavam dos animais feridos, resolviam disputas entre as espécies, sentavam-se em cima dos cogumelos, discutindo assuntos de importância, bebendo chá, desciam pelas correntes de água montados em folhas e cascas de árvore, lançavam-se de árvores com sementes de dente-de-leão. Assim era o mundo onde a humanidade nasceu. Os primórdios, quanto o Homem não passava de um mero convidado recém-chegado que ainda não se tinha assenhoreado deste planeta.
  • O que me interessa agora, e aquilo que eu quero que prenda a vossa atenção é: porque se escondem atualmente essas criaturas?
  • O ponto de fricção entre o Homem e as criaturas da floresta começou com a descoberta da agricultura. Com ela, a civilização floresceu e expandiu-se. As florestas garantiram o fornecimento de madeira para abrigar, enquanto os campos foram usados para o cultivo e as pastagens. A humanidade instalou-se. Já não era um visitante do mundo de outrem, mas, aquele que afastava definitivamente a vida selvagem da soleira da sua porta recém-construída. De início, isto não constituiu um problema. Não havia muita gente, e todos consideravam ser justo ceder-lhes aqueles pequenos hectares para fazerem deles o que quisessem. Alguns até decidiram ajudar. Mudaram-se para os celeiros, ajudando nas tarefas de jardinagem. Os espíritos dos vegetais ajudavam os humanos a organizar melhor as suas sementeiras, informando-os sobre a rotatividade dos cultivos, a correlação entre os ciclos lunares e planetários, o calendário agrícola, sobre a plantação de rabanetes quando a Lua está em Câncer, ou colheitas quando a Lua está em Touro. Os restantes recuaram em direção da floresta, pregando, ocasionalmente, partidas travessas aos novos colonizadores. Mas o domínio do Homem espalhou-se e as florestas foram ficando mais pequenas, e mais pequenas, e mais pequenas. Os seres começaram a amontoar-se nas florestas, enquanto na civilização as coisas iam piorando. A maioria dos agricultores deixou de os escutar. Acharam que podiam aumentar as suas produções descurando as necessidades da Terra. Estavam a aumentar a produtividade, matando o solo.
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  • Agora, por onde andam eles? Estarão mortos? Não. Então, para onde foram? A resposta é um tanto surpreendente. Eles não desapareceram. Nós é que sim.
  • Os primeiros humanos tinham um conhecimento intuitivo do seu papel na natureza, tal como todas as outras criaturas têm. Eles percebiam, através da vida selvagem à sua volta, que tudo tinha uma origem e que nada desaparecia. As coisas mudam de forma. A morte é necessária para que a vida continue. Eles ofereciam as suas mortes como sacrifícios aos deuses da natureza. Ofereciam louvores, orações, sacrifícios e canções ao espírito da natureza.
  • Agora, nós sabemos que tudo o que alguma vez existiu, continua a existir, sob uma forma, ou outra, e tanto quanto podemos afirmar, eles estavam mais despertos para isso então do que nós estamos hoje. Portanto o sacrifício, a canção, o louvor, a oração não asseguravam a imortalidade do sacrificado, em corpo e em espírito. Sempre que matamos, arriscamo-nos a matar a realidade daquela coisa dentro de nós mesmos, bem como no exterior. Dar graças não chega. Quando perdemos essas ligações, tudo perece – e até cada um de nós. Já não há forma de nos alcançarem. Os cinco sentidos que nos restam não são suficientes. E estamos todos com a sensação de que são as florestas, as criaturas, os espíritos e as paisagens selvagens que estão a desaparecer do universo e não nós. Não é bem assim. Fomos nós quem se lançou em queda do mundo real para outro onde podemos levar avante os nossos sonhos distorcidos e estéreis, sem ameaçar a Terra e os seus habitantes. Já se questionaram sobre a razão por que as árvores, as pedras, os rios, as correntes, as aves, as cobras, os ursos e as rãs já não conversam connosco, tal como o faziam nas primeiras histórias dos nativos americanos, ou dos povos hindus, africanos ou nas histórias bíblicas? É por que nós já não estamos lá para o fazer. Hoje ficamos encantados por termos um Gerês, quase selvagem, cascatas belas. Porquê? Algures, não muito longe daqui, as florestas antigas ainda permanecem de pé, os animais vagueiam pelos pastos, o céu está cheio de aves, os veados brincam, os rios correm limpos. Onde quer que exista espaço virgem no nosso mundo de sonho, ainda existirá uma forte ligação com as criaturas da floresta. Até quando?
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  • Acreditem ou não, eles sentem saudades nossas. Às vezes, mais frequentemente do que imaginam, eles enviam almas até ao nosso mundo para nascerem como humanos. Eles sabem aquilo que faz as outras pessoas felizes, e que o que os faz sentirem-se felizes mais do que qualquer outra pessoa viva.
  • Eles habitam os lugares onde as ligações ainda existem: as cascatas, as montanhas, o oceano, a floresta. Eles lançam todo o poder que têm e, às vezes, a magia acontece. Enquanto o resto da humanidade se encontra ocupada em encontrar uma nova e mais eficiente forma de destruir a Terra, carregando simplesmente num botão, eles estão a salvá-la, punhado a punhado. Partilham da convicção comum de que são os únicos seres com sanidade num mundo de loucos. É por isso que são caçados. Talvez nós não os tenhamos visto, porque não estamos preparados para isso, ainda temos de mudar o nosso comportamento. Mas estamos no bom caminho, e isso graças ao ANDAR que nos leva a conhecer os locais onde eles vivem. Esperemos que os anos não nos sugam as memórias.
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  • Nessa noite de sábado fomos caçar gambozinos. São seres imaginários, (serão?) que segundo a superstição popular, vivem no campo, embora algumas espécies habitam locais sombrios e húmidos dos parques das cidades. São descritos como uma espécie parecida com o pirilampo. Definem estes seres como um animal de características especiais, noturno, muito difícil de caçar.
  • Como caçar gambozinos? A caça aos gambozinos faz-se geralmente à noite, sendo popular em Portugal e em várias regiões da Espanha, como na Galiza, onde a estação de caça está aberta o ano inteiro, e não requer licença especial para a prática desta atividade. A caça ao gambozino é considerada um desporto popular, com a intenção de conservar a tradição. Tradicionalmente, são usados sacos de serapilheira para os capturar. É tradição organizar caçada aos gambozinos e convidar pessoas “ingénuas” para ir junto. Frequentemente são levados nestas caçadas, os mais novos. Entre o Douro e Minho, este animal é conhecido por Pio-Pardo. No Baixo Alentejo, é conhecido por Gramutilho. Na Galiza, é chamado de Biosbardo. Não se conhece a origem do significado "Gambuzino". No entanto, pode ter alguma relação com a palavra "Gambito" (ardil para prostrar o adversário) e com a palavra "Gambina" (perna) no sentido de "passar a perna".
  • A famosa Caça aos Gambozinos remonta aos tempos dos nossos "tataravôs". Praticava-se por todo o interior do país, geralmente quando por lá apareciam os "tenrinhos de Lisboa". Claro que também na nossa terra, nas tais ocasiões especiais, se realizavam grandes caçadas e sempre com resultados imprevisíveis!
  • É certo que hoje em dia esta bela atividade caiu em desuso. Ou porque os ditos bicharocos estão em vias de extinção ou porque os jovens citadinos sofrem de agorafobia e sentem-se mais seguros com a PSP VITA, e já não alinham nestas demandas.
  • Os gambozinos são tão velozes que nunca se conseguiu fotografar um único exemplar para amostra. É quase como o lince da Malcata! Para todos aqueles que já não acreditam na existência de "gambozinos", eu vou aqui contar uma bela história, verídica passada numa das aldeias históricas, que prova que os "bichos" ainda existem, escondidos por esses matagais fora, onde a natureza é rainha dessas terras.
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  • Como muitos dos lisboetas aproveitam para passar férias fora da capital. Esta família tinha um filho já espigadote, ao qual eu vou chamar de Zezinho, para salvaguardar a identidade dele, e resolveram passar férias em Sezelhe aldeia que pertence ao concelho de Montalegre. Como é hábito nestas aldeias ao fim de dois dias todas as pessoas se conhecem. O Zézinho arranja um grupo de jovens da aldeia passa os dias e as noites em curiosas aventuras, muito diferentes das habituais. Como ele sempre dizia e se gabava, só ele é que sabia e melhor do que ele ninguém fazia. Uma noite de verão como muitas outras, quente e abafada, como é normal nestas terras transmontanas os jovens resolvem pôr-lho a prova e dar-lhe uma lição.
  • No bar da aldeia, o grupo de rapazes tentava convencer o zezinho (moço alfacinha em férias na aldeia) a participar numa caçada aos Gambozinos. Espantado diz desconhecer essa espécie de mamífero.
  • Ninguém disse uma palavra como era habitual neste tipo de partidas. Todos eram cúmplices. E aquela negação de desconhecimento era sem dúvida o ponto de partida.
  • O Doninha, o dentadas, o cheirete e o socas. Já planeavam o próximo passo.
  • O Dentuças, nome pelo qual os amigos o conheciam, visto ter uns dentes que saiam para fora da boca, parecendo um coelho. Por seu lado o doninha, era magro, tinha um rosto simples, e comum, notável apenas pelos seus estranhos olhos claros. Olhava de forma estranha e quando era preciso entrar num local mais estreito era o doninha quem tomava a iniciativa.
  • O cheirete, parecia um rapaz mergulhado em sangue. Um jovem carnudo com lábios gordos e húmidos e cabelo que cheirava como uma latrina. Desta maneira passaram a chamar-lhe: o Cheirete. O socas: um rapaz que não seria mais velho do que os outros, sem ser gordo, magro ou musculoso, era sem dúvida o mais atinado. O seu nome vem da profissão do pai que fazia tamancos e socas em madeira típico dessa aldeia transmontana.
  • O Zezinho era um rapaz grande, embora não tão grande como o socas, e nem de longe tão forte. Mas o seu entusiasmo estava ao rubro com essa dita caçada.
  • O socas toma a iniciativa.
  • - Se tivermos sorte e apanharmos pelo menos um, é petisco garantido. Mas não sei se devíamos levar o Zezinho, não está preparado para isso, e pode trazer problemas.
  • - Eu sou o melhor da minha escola, e vocês não se vão arrepender. Só tem que me dizer o que fazer.
  • - Não sei. A carne do bicho é tenra e saborosa e perder esta oportunidade de ir fazer barulho e assusta-los. Nunca comeste nada igual. - Dizia o dentuças.
  • Abriu a boca o doninha - Ainda por cima têm uma pele lindíssima, melhor que a de raposa para fazer uma gola de samarra. Eu quero ficar com a pele.
  • Aumentava a curiosidade do zezinho, mas, ainda não tinha convencido o grupo a deixa-lo alinhar naquela caçada.
  • Prontamente o cheirete, que se encontrava mais afastado do grupo decide ajudar a festa. Vocês estão loucos! Ainda não estamos na época de caça aos gambozinos. E ainda por cima este ano os bichos ainda não apareceram por estas bandas.
  • - Olha que o meu pai, hoje de manhã foi ao campo, e disse que já os ouviu no meio do pinhal. Atira o doninha.
  • Disseram os quatro em coro:
  • - Bem, então sendo assim, vamos lá a tentar apanhar um desses bicharocos.
  • - O socas intervém e diz : - quem quer que o Zezinho vá connosco?
  • Vendo que o amigo estava com aqueles olhos abertos e quase a pedir por favor para o levar, levantaram todos, o braço.
  • - Mas com uma condição, és tu que levas o material. Dizia o Socas.
  • - Sim, eu levo o material e mantenho-me em silêncio. Respondeu prontamente o Zezinho.
  • A luz era ainda dourada e ainda não tinha completado o seu desaparecimento do horizonte. Partiram em direção a casa do Varejas, o tasqueiro da aldeia, e fornecedor do material, para os jogos dos, patas-tenras. Logo pediu um saco e um apito ao Varejas e logo o grupo se pôs a caminho do Carvalho grande.
  • O lugar chamado de carvalho grande era, a floresta que se situava nas imediações da aldeia onde predominava carvalhos de longa data e castanheiros esventrados pelo tempo. Locais ideais para caçar gambozinos.
  • Carregado com o saco e o apito, o Zezinho estava em estase. Ao passar junto a uma casa isolada e que o tempo foi deixando marcas. O telhado tinha ruído e o Socas vendo um belo barrote de madeira, ali à mão de semear, diz ao alfacinha.
  • - Agarra já aí esse pedaço de madeira que é o ideal para bater no castanheiro.
  • O rapaz obedeceu prontamente e carregou o barrote aos ombros. Ainda não tinham chegado ao local e o alfacinha já suspirava pelos todos poros.
  • Escusado será dizer que pelo caminho foram contando outras caçadas, com resultados animadores, para entusiasmar o "zezinho".
  • O dentuças era o que fazia maior questão no sucesso do empreendimento, Chegou até a colher um raminho de ervas dizendo que eram ervas de cheiro, próprias para atrair o bicho.
  • Chegados ao local do crime, logo se organizaram. Zezinho, como convidado de honra, ficou no lugar principal - junto ao tronco do castanheiro, com o saco aberto numa das mãos, o barrote na outra e com o apito na boca. Os restantes espalharam-se pelos vários caminhos, tentando barrar a fuga a qualquer bicho que tentasse "dar à sola".
  • Quando todos estavam a postos foi dado o sinal para o começo da ação. O Zezinho, seguindo a risca o que lhe tinham dito, começou a soprar no apito e a bater ritmadamente com o barrote no tronco da árvore.
  • A cambada de acompanhantes foi dando as voltas necessárias, fora do alcance visual do "patareco".
  • Ficaram uns dez minutos a apreciar a cena ao longe. Cansado de esperar e é claro que passado esse tempo, o alfacinha apercebeu-se que estava sozinho, e ficou desnorteado, como nunca. Olhando a sua volta e escuro como breu, começa a chamar pelo grupo. Todos se riam em altas gargalhadas, quase a verter lágrimas o Zezinho pede para ir embora. Sem dizer nada e em silêncio foram todos embora. O Zezinho fica sozinho. Só o doninha, com alguns remorsos e dizendo que o zezinho podia sofrer de "ataques" se ficar nervoso é que voltou atrás para trazer o "patareco" de volta.
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  • Moral da história: Quanto a real existência dos gambozinos, nessa noite não viram nenhum, mas, se o doninha afirmou que o pai os tinha ouvido no pinhal, é porque eles estavam lá.
  • Aqui está a prova da existência do famoso bicho...
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  • Bom, nós não desanimados por não vermos nenhum, muito menos apanhar algum, deixamos o local para trás e lançamo-nos numa outra aventura: celebrar o dia de S. Martinho com castanhas.
  • Deixamos o ponto de encontro em frente ao campo de tiro de Ovar e percorremos a distância até a Vila de Cucujães, mais propriamente a sede do agrupamento 24 do CNE.
  • Castanhas, vinho licoroso, sumos ou outro líquido que ajuda-se a empurrar as castanhas, eram todos os ingredientes naquela hora para fazer a noite animada.
  • No dia de S. Martinho vai-se à adega e prova-se o vinho. Este é o provérbio com que fazemos a festa. Mas provar o vinho sem nada acompanhar, não sabe bem. Junta-se a água-pé e umas castanhas assadas, e inicia-se a festa. Quando chega o outono, o ouriço abre e deixa cair a castanha no chão. É a festa em que se assam as castanhas (que se recolhem nesta altura) e se convive. Tem a ver com o momento em que, depois das vindimas, nos meses de setembro e outubro, o vinho está pronto e se prova.
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  • A sala era acolhedora e, mantivemo-nos num aconchego total. Antes de a batata chegar à Europa e se espalhar por todo o lado (séc. XVII), a castanha era a base da alimentação, especialmente no campo. Pode cozer-se, assar-se, fazer-se em puré, fazer-se sopa com ela, doce, etc.
  • O dia 11 de novembro é dedicado a São Martinho e em vários pontos do país, celebra-se com eventos onde a castanha é a rainha e junta-se a festa jeropiga e animação.
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  • Nos não festejamos no dia 11, mas, sim sábado dia 9 de novembro como consta no calendário sobre a porta de entrada da sede do 24.
  • A hora já ia avançada e em seguida, entramos na segunda parte deste trilho ou, melhor, do dia. O espaço tinha sido requisitado para nós e isso justificava-se dado a quantidade de caminheiros. Os momentos que se seguiram não ficaram nada atrás de qualquer outro encontro realizado por esse Portugal fora. Foi um verdadeiro espetáculo de alegria e amizade. Aliado às castanhas e à boa jeropiga (destrava línguas), nada mais havia a fazer do que deixar-nos levar pelos encantos do momento e ingressarmos neste cenário de boa disposição. Se havia tristeza, naturalmente que esta não entrou pela porta e manteve-se de fora.
  • Com o avançar das horas, já a sala se tinha transformado numa verdadeira alegria. Bom, a amizade não tem preço e foi precisamente isso que se passou. Juntou-se à mesma mesa um grupo de amigos que se divertiram como uma família unida. Foi bom enquanto durou... Espero que haja muitos mais S. Martinho para se festejar com este grupo animado e simpático.
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  • Quem sabe se na próxima caminhada não teremos surpresas idênticas?
  • Até lá um bem-haja a todos.
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  • Agostinho Santos (Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.)
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